Andei ausente, bem sei. Acontece que alguma coisa em mim fez com que eu
me fechasse como se casulo fosse. Cerrei os olhos pelo curto espaço de
umas poucas semanas e, quando dei por mim, uma infinidade de borboletas
bateram em revoada do céu da boca. Silêncio; um suspiro temporal. Mas
não daqueles que empobrecem o espírito, não, não. Daquele silêncio
gutural que reestrutura a madrugada, acomoda, acalma, shhhhhhhh, a cada
noite que se passa. Se eu tivesse uma lua em meu bolso, eu me encheria
de escuridão. E quem sabe um ou dois sapos coachariam em alguma lagoa.
Foi com cuidado que arrastei minhas duas mãos da testa ao fim do cabelo,
tendo o cuidado de cravar o dedos: não poderia deixar jamais que algum
desassossego aqui ficasse. Com a maestria dos primeiros vaga-lumes que
se atrevem a acender as primeiras luzes da terra, converti minha
inquietude em nuvens de fumaça e soprei para que a noite as levasse numa
brisa fria. E agora dois sapos coachavam ao fundo, confirmando que o
silêncio morria de pouco em pouco com o galopar da manhã acobreada, que
aproximava sem nada ninguém ver. Eu pouco enxergava, é verdade. Tirei do
bolso a lua que outrora parecia ser minha e a esfarelei pelo breu do
firmamento, em uma inumerável centelha de pequenas estrelas
itinerantes. Foi assim a história da noite que iluminei o incrível céu
acima de nós. Antes que o sol enfim chegasse, a noite cravejou-se das
constelações que já não se viam e, tornou-se, por outro suspiro de
tempo, palidamente, dia. Existe luz quando a procuramos. E as
incontáveis borboletas agora retornavam com a minha resposta: as
palavras em mim nunca morreram. Metamorfosearam-se.
Cristiano Guerra, que me traduz com as palavras.